Taxas Demográficas, Exposição ao Risco e Pessoas-ano Vividos
ESTRUTURA DAS TAXAS DEMOGRÁFICAS
Relembrando a Equação de Balanceamento da Mudança Populacional:
- N(T) — total de pessoas vivas na população no tempo T (final)
- N(0) — total de pessoas vivas na população no tempo 0 (inicial)
- B[0, T] — número de nascimentos na população entre o tempo inicial (0) e o tempo final (T)
- D[0, T] — número de mortes na população entre o tempo inicial (0) e o tempo final (T)
- I[0, T] — número de imigrantes entre o tempo inicial (0) e o tempo final (T)
- O[0, T] — número de emigrantes entre o tempo inicial (0) e o tempo final (T)
→ São quatro fluxos de eventos/transições que alteram o tamanho da população: nascimento, morte, imigração, emigração
→ Nascimentos, mortes, emigrações = eventos relacionados a indivíduos presentes na população antes do evento
→ Imigração = evento relacionado a indivíduos que não estavam presentes na população antes do evento
→ Nascimentos, geralmente, envolvem dois indivíduos da população e não apenas um indivíduo (são necessários dois indivíduos para produzir um nascimento)
Taxas demográficas — úteis para relacionar o tamanho de cada um dos quatro fluxos (número de ocorrências dos eventos/transições) e o tamanho da população que está produzindo esses eventos/transições.
Convém revisar alguns conceitos
Contagens, proporções, razões, taxas e probabilidades
Contagem — apenas um número ou uma série de números. Exemplo: população mundial estimada em 2007 era de 6,7 bilhões de pessoas.
Proporção — é uma medida relativa; uma razão em que o denominador inclui o numerador. Exemplos: proporção de pessoas com menos de 15 anos em uma população, proporção de mulheres na população → número de mulheres [numerador] dividido pelo total da população [denominador].
Porcentagem — proporção multiplicada por 100 → resultado é expresso por 100. Exemplo: uma população possui 51% de mulheres → de cada 100 pessoas destas população, 51 são mulheres.
Exemplo de proporção, porcentagem e razão (obs.: dados desatualizados)
Razão — é simplesmente um número dividido pelo outro → expressa o tamanho relativo de dois números. Exemplo: razão de sexo (total de homens dividido pelo total de mulheres → em 2007, a razão de sexo mundial era 1,02 homens para cada mulher.
Numerador e denominador de uma razão podem ou não ser subconjuntos de uma mesma variável. Exemplo: densidade demográfica — razão habitantes/km quadrado.
Obs.: as proporções são um tipo especial de razão, em que numerador está contido no denominador.
Taxa — também é um tipo especial de razão e refere-se à ocorrência de eventos ao longo de um intervalo de tempo. Relaciona o número de eventos (ou outra variável demográfica) e a população durante um período específico de tempo (geralmente, a população do meio do ano). Exemplos: taxa bruta de mortalidade; taxas específicas de mortalidade por idade.
Uma taxa é o número de eventos ocorridos ao longo de um período de tempo dividido pela duração da exposição das pessoas ao risco de ocorrência deste evento (pessoas-ano vividos). Como é difícil medir com exatidão esta exposição, geralmente utiliza-se a população do meio do ano como aproximação.
Probabilidade — similar a uma taxa, mas com uma diferença importante: no denominador, constam todas as pessoas de uma população no início do período considerado.
Ou seja, a probabilidade não usa a duração da exposição ao risco e sim a população presente no começo do período observado → população inicialmente sob risco de ocorrência do evento.
Na Tabela de Sobrevivência: taxa de mortalidade em um determinado ano é diferente da probabilidade de morrer neste mesmo ano.
Retomando:
Em Demografia, as taxas geralmente são dadas pela razão entre ocorrência e exposição:
Taxa = Número de ocorrências / Pessoas-ano de exposição ao risco de ocorrência
- No numerador, considera-se o número de eventos ocorridos durante o período de tempo definido.
- No denominador, a exposição ao risco considera o número de pessoas em uma população e o tempo em que estas pessoas estiveram expostas ao risco durante um período de tempo definido.
→ espera-se que o número de ocorrências seja maior em uma população maior
→ espera-se que o número de ocorrências seja maior à medida que o tempo de exposição dos indivíduos seja maior
- Portanto, o denominador considera tanto o tamanho da população quanto o tempo em que ela esteve exposta ao risco = pessoas-ano vividos em determinado período de tempo.
Obs.: a taxa resultante será uma taxa anualizada
A população total muda a cada instante (a todo momento, pessoas nascem e morrem) e a contagem do total exato de pessoas-ano vividos não é trivial.
Representação da exposição individual através da “linha de vida”:
- ponto A: início (nascimento)
- ponto B: evento terminal (morte)
- θ1, θ2 e θ3: ocorrência de interesse (nascimento dos filhos, ocorrência de internações hospitalares, movimentos migratórios, etc.)
Para alguns eventos, será necessário restringir o denominador — captar apenas os indivíduos de fato expostos ao risco do evento.
Por exemplo, risco de nascimento: utiliza-se uma faixa de idade fértil (para mulheres, considera-se 15 a 49 anos)
Considerando agora um Grupo G de quatro indivíduos e suas respectivas “linhas de vida”:
- A1 … A4 : nascimento
- B1 … B4 : morte
- θs : ocorrências do evento de interesse
- ∑ — representa o somatório para todos os indivíduos i que pertencem ao Grupo G
- Ni — total de ocorrências do evento para o indivíduo i (i=1, 2, 3 ou 4)
- Ti — tempo de vida do indivíduo i (tempo entre Ai e Bi)
TAXAS DE PERÍODO E PESSOAS-ANO
Considere um período específico de 0 a T .
Se a pessoa viveu todo o período entre 0 e T, ela contribuiu com uma pessoa-ano ao denominador da taxa de período.
Se a pessoa viveu 1 dia, ela contribuiu com 1/365 de uma pessoa-ano.
São somadas todas as contribuições individuais para chegar ao denominador de pessoas-ano vividos entre 0 e T.
Demonstração através das linhas de vida e da equivalência entre dois métodos de registro das pessoas-ano:
Nas figuras abaixo, temos sete indivíduos de uma população hipotética:
- deseja-se calcular o número de pessoas-ano vividos por essa população hipotética
- período: 12:00h de 1º jan 1981 até 12:00h de 1º jan 1982
- pessoa 1: contribuiu com 1 pessoa ano
- pessoas 2 e 3: contribuíram com 3/4 de uma pessoa-ano
- pessoa 6: nasceu e morreu durante o período, contribuiu com 6 meses (1/2 pessoa-ano).
- Total de pessoas-ano vividos pela população hipotética = 4,75
Método alternativo: ignora as trajetórias individuais
- registra o total de pessoas vivas em vários intervalos de tempo
- a cada trimestre, contabiliza o total de pessoas
- cada trimestre tem peso 1/4
- a altura representa o número de pessoas; a largura representa a fração de um ano
- primeiro trimestre: 4 pessoas vivas na população, que contribuíram com 1/4 de pessoa-ano cada uma (4 * 1/4 = 1 pessoa-ano)
- segundo trimestre: 6 pessoas vivas, constribuindo com 1/4 de pessoa-ano cada uma (6 * 1/4 = 1,5 pessoa-ano).
- total de pessoas-ano vividos pela população hipotética entre 1º jan 1981 e 1º jan 1982 = 4,75
Person-years (PY):
Em notação convencional:
- Ni : número de pessoas vivas no trimestre i
- Δi : fração do ano representado pelo trimestre
Se o registro fosse por dia e não por trimestre, a soma poderia ser representada por:
Se o registro considerasse períodos muito pequenos de tempo:
→ neste caso, a integral (∫) substitui o símbolo da soma (∑)
→ dt substitui Δi
Álgebra ou cálculo: intercambiáveis
Notação algébrica — utilizado na prática quando a mensuração se dá em intervalos discretos
Notação de cálculo — mais compacto, teoremas aplicáveis aos processos populacionais
PRINCIPAIS TAXAS DEMOGRÁFICA DE PERÍODO
Voltando à Equação Balanceadora…
Dividindo cada elemento da Equação Balanceadora de Crescimento Populacional pelo número de pessoas-ano vividos entre 0 e T, teremos quatro taxas:
Taxa Bruta de Natalidade
- CBR expressa a taxa em que a população está aumentando devido aos nascimentos
Taxa Bruta de Mortalidade
- CDR expressa a taxa em que a população está diminuindo devido às mortes
Taxa Bruta de Imigração
- obs.: conexão entre a exposição ao risco e o evento não é tão precisa — os indivíduos da população (denominador) não estão, de fato, expostos ao risco de imigrar para dentro de sua própria população.
- CRIM expressa a taxa em que a população está crescendo como resultado da imigração
Taxa Bruta de Emigração
Pessoas-ano: conceito central na Demografia — idealmente, as taxas deveriam considerar o número de pessoas-ano da população em estudo.
Ao longo de um ano, todo indivíduo presente no início e no fim do ano deveria ser contado como uma pessoa-ano. Aqueles que faleceram nesse ano e aqueles que nasceram durante o ano, deveriam ser contabilizados de acordo com a fração de ano vivido.
Entretanto, apesar de sua importância, sua mensuração é extremamente difícil para grandes populações.
Solução para estimar o total “aproximado” de pessoas-ano: usar a estimativa da população total para o meio do ano. Pressuposto: nascimentos e óbitos ocorrem de maneira uniforme ao longo do ano.
Observações importantes:
- comumente, calculam-se taxas anuais → expressam número de eventos por ano de exposição;
- o período de referência deve estar claro para que uma taxa faça sentido (ex.: dizer que a mortalidade infantil no Brasil é de 9 em 1000 não tem significado) — devemos saber em qual período foram contados os eventos do numerador e as pessoas-ano do denominador.
Taxa Bruta de Crescimento
Equação de Balanceamento da Mudança Populacional:
Rearranjando a equação 1.1 e dividindo ambos os lados pelo total de pessoas-ano vividos entre 0 e T:
- CGR [0, T] (crude growth rate) — Taxa Bruta de Crescimento: mudança no tamanho da população dividido pelo total de pessoas-ano vividos entre 0 e T.
- sendo N(T) maior que N(0) → taxa de crescimento positiva
- CGR = CBR — CDR + CRIM — CROM
- Taxa Bruta de Crescimento Natural (CRNI — crude rate of natural increase) = diferença entre taxas brutas de nascimentos e de mortes
- Taxa Bruta de Migração Líquida (CRNM — crude rate of net migration) = diferença entre taxas brutas de imigração e emigração
Próxima aula: Duas outras formas de taxa de crescimento em Demografia: taxa de crescimento instantânea e taxa de crescimento média anual.
MATERIAL EXTRA
ALGUMAS FONTES DE DADOS:
IBGE → População → Projeções da População:
Tema: População:
Projeções populacionais do Brasil e das UFs:
MIGRAÇÕES INTERNAS
Fontes de informação para estudos migratórios (a partir da pág. 87):
- https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9197-mudanca-demografica-no-brasil-no-inicio-do-seculo-xxi.html ou
- https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv93322.pdf
→ Pesquisas domiciliares → Censos Demográficos → Tema Migração:
- Base de dados mais completa
- Nível do município
→Principais informações disponíveis nos censos demográficos:
- local de nascimento (UF ou país estrangeiro);
- tempo de moradia na UF/município atual;
- UF/município ou país de residência anterior (migração de última etapa);
- UF/município de residência há extamente 5 anos (migração de data fixa)
→ Cálculo do número de migrantes:
- Método indireto: saldos migratórios → estimativa de resíduo:
- comparação da população esperada (dadas as funções de mortalidade e fecundidade) com a população efetivamente observado ao final do período (ex.: entre dois censos demográficos)
- diferença entre pop esperada e pop observada = migração líquida.
- Método direto: utiliza quesitos de migração do questionário do Censo Demográfico:
- informação de migração de data fixa (UF/município de residência 5 anos antes da data de referência do Censo)
- permite cálculo do saldo migratório das UFs
Relatórios Metodológicos: Projeções da População — Brasil e UFs — Revisão 2018 (pág. 42)
- https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101597.pdf
- saldos migratórios estimados por UF para os quinquênios 2000/2005 e 2005/2010
Para a próxima aula (18/02):
A partir dos dados da Unidade da Federação escolhida:
- Calcular as Taxas Brutas de Natalidade, de Mortalidade, de Imigração e de Emigração (ou a Taxa Bruta de Migração Líquida), além da Taxa Bruta de Crescimento;
- Reproduzir o Box 1.2 do livro do Preston (Cap. 01);
- Indicar as fontes de dados e limitações;
- Descrever como o denominador das taxas brutas (número de pessoas-ano vividos) foi estimado.